//O confrade ‘agitador’

O confrade ‘agitador’

Eis um exemplo de que as confrarias (algumas) não são apenas grupos de ‘comes e bebes’.

Pela minha ligação profissional à gastronomia e por essa via ter o privilégio de ser membro de algumas Confrarias Gastronómicas, sou por vezes confrontado com a provocação: “esses grupos que não fazem mais nada, do que comer e beber”.
A ‘intensidade’ da minha resposta, obviamente, depende do interlocutor, embora pense que existe alguma razão. Mas não se pode ver ‘a mesa pelo prato’ ou seja, no universo de associações deste tipo, existem algumas que fazem muito mais do que comer e beber.

Vem esta introdução a propósito de um texto publicado recentemente no penacovactual.pt e assinado por Luís Pais Amado, que penso ser ainda (atualmente) Juiz da Confraria da Lampreia de Penacova.

A propósito da época da Lampreia que agora se inicia e faz de Penacova um destino privilegiado para muitos ‘amantes desta iguaria’, o confrade coloca alguns ‘pontos nos is’, referindo os restaurantes como “beneficiários líquidos – e exclusivos – do investimento” e os vendedores do produto como intervenientes que são “na maior parte das vezes indiferentes à origem e, até, ao pagamento de impostos”.

Trata-se, como facilmente se percebe, de um ‘agitador’ que, ainda por cima, coloca questões e responde desta forma (transcrevo):

“É correcto que o esforço de todo um Concelho não tenha nenhuma (digo bem, nenhuma) comparticipação do sector da restauração?
– Não só não é, como constitui um péssimo exemplo para os outros sectores de actividade!
E pode admitir-se a circulação de um produto sem regras, sem caracterização, sem certificado de origem?
– É claro que isso constitui um factor triste da pequenez a que vamos chegando enquanto País.”
E termina perguntando: Por onde andam, afinal, as Autoridades?

Tratando-se de um texto assinado por Luís Amado, não sei se reflete também a posição da Confraria da Lampreia, de qualquer modo, já é muito bom que um confrade tenha a coragem de levantar questões que, às vezes parece que não, mas são, evidentemente, muito importantes para os objetivos assumidos nos estatutos das confrarias gastronómicas.

De tal forma assim é, que José Maria Moreira, formador de cozinha e confrade de algumas confrarias, não resistiu a comentar: “Excelente exemplo do papel que pode e deve ter uma confraria… agitar consciências e aglutinar vontades para conseguir os melhores resultados”.

E este pequeno exemplo mostra como, afinal, as confrarias podem não servir apenas para os ‘comes e bebes’. Nos ‘intervalos’, podem falar, refletir e ‘agitar’ ou seja, levantar questões importantes para a defesa da gastronomia.. E este é apenas um exemplo.

Amilcar Malhó