A caneja é um peixe seláquio, também conhecido por pata-roxa ou ainda peixe-couro, aparentado com o cação, em dimensão e morfologia, embora difira por ostentar barbatanas peitorais menores e pintas ao longo do dorso.
A infundice é um processo de preparação específico a que o peixe é submetido, ao longo do qual adquire um intenso odor amoniacal, reminiscente a urina, mas sem apodrecer. Congrega apreciadores à volta, que levam a que se torne um particularismo cultural e um exclusivo gastronómico da vila da Ericeira, único no país.
Sucintamente, a caneja fresca é aberta e limpa, retiradas as tripas e a cabeça, lavada em água do mar e golpeada ao longo do dorso, salpicada de sal. É estendida num pano branco, de fibras naturais, que permitia a exsudação do peixe, que se entala entre os golpes. De seguida, é envolta com o pano restante, em anel, envolta por outro pano, camadas de jornal e colocada dentro de saca de estopa. Alguns, deixam-na a fermentar sobre um cesto de verga; guardada dentro de armário, no escuro; ou ainda pendurada.
Há ainda relatos que, antigamente, seria enterrada. Este período varia consoante o estado do tempo, em média 12 dias. Na altura de ser cozinhada, é desembrulhada, lavada em água do mar e posta a enxaguar. Corta-se em postas, deixada a cozer num tacho com água e sal (pode levar uma cebola para dar mais paladar). As batatas são cozidas à parte, com pele, senão ficam negras. Depois de cozida, a caneja apresenta cor alva, textura firme e é temperada com azeite, o qual, ao cair sobre o peixe, torna-se esbranquiçado e leitoso, pela reação química que as duas substâncias desencadeiam.
A caneja de infundice não se comercializa por venda aberta, direta ao público.
Costuma ser preparada e consumida à porta fechada, em contexto familiar, no domínio privado, por convite ou encomenda.
Um pouco de história
São desconhecidas as origens da Caneja de Infundice; o porquê da sua elaborada e estranha preparação e consumo, bem como a sua persistência nesta localidade, não obstante o aspeto, forte odor e paladar deste prato.
Este é um tema especulativo, embora dois factos sejam incontestados; a sua estreita ligação com a comunidade piscatória da Ericeira e antiguidade desta prática alimentar.
Harmonização
Diz-se que o vinho tinto adoça com a caneja e é verdade quando se trata de vinhos correntes, mas aconselhamos o vinho Porta da Tapada, da Adega Cooperativa da Azueira, predominado pelas castas Castelão, Aragonês e Alicante Bouschet. Vinho de cor ruby com aromas frescos de frutos vermelhos e bagas silvestres, envolvidos por taninos suaves, com ligeira acidez que confere elegância e persistência ao conjunto. No final, apresenta-se com um paladar equilibrado, suave e fácil de beber.
Atividade
Com o objetivo de garantir a continuidade da tradição e democratizar o acesso a este raro petisco, foi criada, em 27 de novembro de 2015, a Confraria da Caneja d’Infundice, sob iniciativa da Junta da Freguesia da Ericeira com o apoio da Câmara Municipal de Mafra.
(Conteúdos produzidos pelo município de Mafra, para ‘Harmonizações, histórias e Memórias’, aquando da comemoração dos ‘21 Anos da Gastronomia Património Cultural’, promovida pela AMPV – Associação de Municípios Portugueses do Vinho)