Também ajudou na missa, tarefa que lhe rendia “mais uns tostões”. Curiosamente, hoje, uma das ruas que dá acesso à entrada da igreja Matriz tem o seu nome
Também ajudou na missa, tarefa que lhe rendia “mais uns tostões”. Curiosamente, hoje, uma das ruas que dá acesso à entrada da igreja Matriz tem o seu nome já que, a 6 de Junho de 2004, por proposta de Carlos Alberto Oliveira, presidente da Junta de Freguesia de Caldelas, foi aprovada por unanimidade a atribuição do nome e a escolha daquele e não de qualquer outro arruamento, como consta da ata que se transcreve:
No segundo ponto da ordem de trabalhos, foi apresentado aos presentes, pelo Sr. Presidente da Junta, uma proposta de atribuição da toponímia António Silva, com menção Chefe Silva, à rua que tem início na Igreja Paroquial, passagem pelo Cemitério de Caldelas e términos junto da Capela do Senhor da Saúde, como forma de homenagem da figura supracitada. O Sr. Presidente da Junta justificou a necessidade e oportunidade desta homenagem como forma de reconhecimento pelos inestimáveis serviços e dedicação contínua que o eventual homenageado sempre revelou pela sua terra natal. O Sr. Presidente da Junta explicou a escolha do referido arruamento com o facto de no seu início, estar a casa onde nasceu o eventual homenageado. Levada a referida proposta a votação pelo Sr. Presidente da Junta, foi aprovada por unanimidade. Mais ficou decidido por unanimidade, o envio à Assembleia de Freguesia de Caldelas desta proposta de toponímia, de modo que a mesma possa seguir os trâmites legais para eventual adoção.
Numa boa parte da Rua Chefe Silva, ficam os muros da propriedade onde se situa o restaurante “Churrasqueira de Caldelas” que do ponto de vista gastronómico é muito mais do que o nome faz pressupor.
Sempre que por lá passa o “filho da terra” faz uma visita ao amigo José Antunes e “nunca se esquece de ir até à cozinha cumprimentar quem lá está”. Até porque aquele preciso local lhe trás à memória a Pensão Universal, onde também trabalhou a lavar tachos e panelas.
Apesar de oito anos mais novo, o proprietário do restaurante não esquece que o amigo “levou um pontapé da vida mas soube erguer-se e lutar”.
Salienta, reconhecido, que o concelho de Amares e a freguesia de Caldelas “devem-lhe muito, pois sempre afirmou com orgulho as suas raízes”.
Embalado pela oportunidade de deixar escrito o seu testemunho acrescenta:
“Não tenho dúvidas em afirmar que as pessoas ligadas à restauração lhe devem muito e por isso, tem muitas centenas de amigos e admiradores, por todo o país, na nossa área de negócio.”
A ida para Lisboa
Nas suas ocupações laborais na juventude, António da Silva ainda criou calos nas mãos e sentiu o peso dos tijolos e dos baldes de cimento, a trabalhar nas obras de construção de casas, para os outros. Sim, para os outros, porque o grande desejo de oferecer uma casa à mãe, só o concretizou muitos anos depois.
Andou com um tio no negócio de gado e aos 18 anos, quando voltou para Lisboa, era ferreiro. Apanhou o comboio em Braga e com ele trazia pouco mais que a roupa que tinha vestida e umas laranjas “retiradas” do pomar de um vizinho.
Bateu de novo à porta de casa do irmão em Fevereiro de 1952, um mês antes de fazer 19 anos. Desta vez não levou “raspanete” e de imediato iniciou a difícil tarefa de encontrar um emprego.
O jovem António, certamente mais preocupado em “arranjar trabalho” do que em saber notícias, não se terá apercebido que, mais ou menos por esta altura, se iniciava em Londres o reinado de Isabel II. Também na capital do Reino Unido estreou o filme “Luzes da Ribalta” de Charles Chaplin, que em Portugal estreou um ano depois.
Também em Portugal, neste mesmo ano de 1952, outro António Silva estaria em destaque com a estreia da comédia cinematográfica “Os 3 da Vida Airada” de Perdigão Queiroga, com Milú, António Silva e Eugénio Salvador.
É também deste ano, a colheita daquele que seria o primeiro Barca Velha a ser comercializado.
Em Lisboa, uma refeição entregue no domicílio, o “almoço para fora”, por exemplo pelo Restaurante Isaura no Areeiro, constava de sopa, um prato de peixe ou de carne, dois pães e uma peça de fruta e custava a módica quantia de quinze escudos (menos de 10 cêntimos).
Influenciado por familiares que já trabalhavam em hotelaria, o jovem Silva queria ser empregado de mesa de hotel e imaginava-se “todo catita” com um fato impecavelmente limpo e engomado, um laço ao pescoço e as unhas sempre limpinhas.
Mas o destino trocou-lhe as voltas. Tímido e pouco expressivo, não mostrava grande aptidão para o contacto direto com os clientes.
Foi para o restaurante Paris, na Rua dos Sapateiros, ganhar 300 escudos e como não conseguiu o ambicionado lugar de empregado de mesa, o seu destino foi a cozinha.
Naquele tempo os cozinheiros eram conhecidos pelos “queima cebolas” e os empregados de mesa, pelos “gamelas”.
Passados apenas oito dias de serviço no Restaurante Paris, foi ocupar uma vaga no Suísso Atlântico Hotel, na Rua da Glória em Lisboa, onde já trabalhava um sobrinho.
Estávamos a 7 de Maio de 1952 e o “novato” começou por lavar travessas.
Era’tornante’, nome atribuído a quem fazia as folgas dos outros, o que acabou por ser benéfico pois ficava a conhecer um pouco das várias atividades.
Chegou mesmo a ajudar o pasteleiro, o que lhe permitiu um primeiro contacto com uma especialidade em que viria também a destacar-se e de que sempre muito gostou.
Pouco mais de dois anos depois, em 6 de Julho de 1954, foi para o Hotel do Império,
hoje denominado Britania. Projetado pelo arquiteto Cassiano Branco, esta unidade hoteleira surpreendeu pela estrutura imponente, pelo conforto que proporcionava e pela decoração de linhas “art déco” que lhe davam um toque de modernidade e o tornavam numa referência única no turismo nacional.
Foi para o Império “para aprender mais e não pelo dinheiro” ressalva, acrescentando que esta foi uma opção justificada pelo facto de “este ser, juntamente com o Aviz, um dos melhores hotéis que havia então em Lisboa”.
Recorda que naquele tempo “era chique comer nos hotéis, embora também existissem bons restaurantes como o João do Grão e o Tavares”.
Analisado hoje, torna-se curioso o facto de aos empregados ser destinado sobretudo peixe, que não era tão valorizado como agora, nomeadamente pargo e tamboril “que mesmo assim, nem todos os empregados queriam”, lembra o Chefe.
Aos clientes servia-se fundamentalmente garoupa, pescada e cherne. “Mas a pescada estava na moda e havia muitos apreciadores de uma cabeça de pescada, das grandes, com grelos, as ovas e o fígado”.
Era, também, um tempo em que os galegos tinham grande influência na cozinha lisboeta.
(Nota – Os textos aqui reproduzidos foram publicados em 2008 pelo que poderão verificar-se ‘desatualizações’)
Fotos:
Capa: Hotel Império
Interior: Placa da rua com o seu nome em Caldelas
Chefe Silva – Biografia, tem o patrocínio de:
Do valor dos patrocínios, 25% é atribuído à área de Formação da ACPP – Associação de Cozinheiro Profissionais de Portugal, de que o Chefe Silva foi um dos fundadores.
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